Em vida, Florbela Espanca foi praticamente ignorada pela crítica, e mesmo pelos apreciadores de poesia. Isso lhe causou uma angústia tão significativa que fez com que perdesse a vontade de viver. Na verdade, desde seu nascimento, foi marcada pelo incomum e pelo dramático. Filha de João Maria Espanca, Florbela tinha como mãe uma mulher escolhida para concebê-la, mas que não era esposa de João Maria. Esta - Maria Toscano - não podia ter filhos e, cumprindo uma tradição medieval, João Maria escolhe uma mulher com quem possa ter filhos, Antônia da Conceição Lobo, com quem também teve outro filho - Apeles. Abandonados por Antônia, Florbela e Apeles passam a viver com João maria e sua esposa.
Desde cedo, Florbela vê aflorar sua veia poética, assim como também desde muito cedo demonstra propensabilidade para a melancolia. Aos 7 anos (1903), escreve seu primeiro poema - "A Vida e a Morte" - cuja temática e tessitura desvelam um caráter taciturno e sombrio, claramente melancólico, o que se constituirá na tônica de seu fazer poético.
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Publicou em vida dois livros de poesia, Livro da Mágoa (1919) e Livro de Soror Saudade (1923), ficando Charneca em Flor (1931), Juvenília (1931) e Reliquiae (1934) para serem publicados postumamente. Seus versos são fortes, viscerais, denotam exaustão e desilusão, desencantamento, com uma carga importante de sensibilidade. Considerada a figura mais importante do universo poético português, sua obra se constitui num misto de evocação de suas próprias experiências amalgamados à sua fantasia e criação estética.
Impossível não se envolver na profundidade ensejada nos textos de Florbela.
Fanatismo
Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não é sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!
Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
"Tudo no mundo, tudo passa..."
Quando me dizem isso, toda a graça
Duma boca divina fala em mim
E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah, podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como um Deus: Princípio e fim!"
Fumo
Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!
Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!
Os dias são outonos: choram... choram...
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...
Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E é ele, ó meu amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...
Impossível não se envolver na profundidade ensejada nos textos de Florbela.
Fanatismo
Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não é sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!
Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
"Tudo no mundo, tudo passa..."
Quando me dizem isso, toda a graça
Duma boca divina fala em mim
E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah, podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como um Deus: Princípio e fim!"
Fumo
Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas,
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!
Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas...
Abertos, sonham mãos cariciosas,
Tuas mãos doces, plenas de carinhos!
Os dias são outonos: choram... choram...
Há crisântemos roxos que descoram...
Há murmúrios dolentes de segredos...
Invoco o nosso sonho! Estendo os braços!
E é ele, ó meu amor, pelos espaços,
Fumo leve que foge entre os meus dedos!...
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