quarta-feira, 8 de junho de 2011

JUSTO A MIM ME COUBE SER EU?

Toda vez que minha avó paterna me dizia que o molde em que fui feita fora quebrado quando nasci, eu achava que ela estava me elogiando. Acreditava que somente eu era “única” no mundo. Aos poucos, fui percebendo meu engano.
Essa exclusividade – recebida com o meu nascimento – não me foi dada assim de mão beijada. Nem veio pronta, nem tinha manual.
Cedo percebi que jamais teria sossego e que teria muito trabalho. Típico presente de grego, uma armadilha. Encontrei eco para o meu espanto nas palavras da Mafalda, a famosa personagem de Quino, o cartunista argentino, no momento em que ela diz: “Justo a mim me couber ser eu!”. Ser quem a gente pode ser é quase uma desolação. Quem eu sou e deverei ser? Minha individualidade é um mistério.
Quando percebo que um gesto qualquer vai afetar o meu destino, sinto medo, sinto angústia, suo frio, tenho vertigens, adoeço. Ai, a tentação de pegar carona na escolha dos outros ou no estilo de vida deles é grande, mas minha alma grita que não vai dar certo e me lembra que meu molde foi quebrado, que ele é exclusivo.
Levei muito tempo para entender que minha exclusividade não está simplesmente em mim. Ela está sempre lançada adiante de mim como um desafio, como um destino a que tenho de chegar, como uma história que tem que ser vivida. Minha exclusividade – eu mesma – virá apenas quando eu puder afirmar que a história que vim realizando só eu – mais ninguém – poderia tê-la vivido.
Este é o mistério que envolve o problema de ser quem somos: autenticar nossa biografia. Avalizá-la.
Onde estou, senão no rastro da história que venho deixando atrás de mim, naquilo que vim fazendo ou dizendo? Onde estou, senão nessa biografia que realizo e atualizo a cada instante por meio das minhas decisões e do meu empenho?
Hoje não me importo mais se sou diferente dos outros, mas se faço alguma diferença neste mundo.
(Dulce Critelli)
Barrinha MaynaBaby

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